quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

É BOM LER DE NOVO...

"Legitimidade para agir

Quando indagadas sobre os aspectos constitucionais, logísticos e operacionais que envolveriam a participação ostensiva das Forças Armadas no combate à criminalidade em apoio às forças estaduais, as autoridades militares normalmente costumam recorrer – aliás, com justificadas razões – a um arcabouço jurídico para mostrar os empecilhos legais a serem contornados para a execução da missão. Além disso, ressaltam que a formação profissional militar é incompatível com a tarefa a ser cumprida e defendem o comando das ações como condição sine qua non para seu ingresso nas operações.

Não há duvida de que todas essas ponderações são procedentes e caberiam perfeitamente no caso de uma situação excepcional de segurança pública nacional que exigisse uma investida militar de emergência, com o emprego de suas principais forças, como tanques de guerra e numerosos contingentes em tropas. Contudo, após a manifestação de numerosas especulações e opiniões diversas, parece estar se consolidando o senso comum de que a aplicação de tais forças de destruição no combate direto ao crescimento da violência nas zonas urbanas e rurais de todo o país não só é desproporcional, como também incompatível com as reais necessidades de prevenção e repressão à criminalidade.

Ao mesmo tempo, as ponderações apresentadas pelas autoridades militares não se encaixam às ações específicas que podem ser desempenhadas pelas Forças Armadas – neste caso, sem quaisquer conflitos constitucional, logístico e operacional – e que trariam enorme contribuição para o efetivo combate às forças criminosas que assolam o país.

Como peça fundamental da engrenagem nacional de segurança pública – de cuja estrutura fazem parte a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária Federal e as Polícias Civil e Militar – o Exército, a Marinha e a Aeronáutica podem realizar muito mais do que aquilo que, por si só, já seria um feito histórico: o efetivo controle da entrada de armas, munições e drogas que passam pelas fronteiras do Brasil e chegam às mãos dos criminosos que concentram seus negócios, principalmente, nas áreas urbanas de maior densidade demográfica.

Embora quase nunca se diga – e talvez poucos saibam –, as Forças Armadas dispõem de instrumentos legais para realizar tarefas de cunho policial, quando há ocorrência de crimes militares. O inquérito policial militar (IPM) oferece aos militares os mesmos dispositivos legais dos quais se utilizam as polícias judiciárias estaduais para investigar os crimes comuns.

A partir da abertura do IPM, os militares encarregados da apuração de um crime militar podem investigar, tomar depoimentos, promover acareações, realizar interceptações telefônicas mediante autorização concedida pela Justiça Militar, solicitar mandados de prisão e de busca e apreensão, e realizar incursões nos locais relacionados à elucidação do crime, com o emprego da força policial-militar adequada à operação.

Como se vê, o IPM permite às Forças Armadas o desenvolvimento das investigações pertinentes ao desvendamento da autoria de crimes militares, sobretudo os mais preocupantes deles: furtos e roubos de armas de unidades militares. A ocorrência desses crimes tem sido freqüente e servido para fortalecer ainda mais os traficantes de drogas, como comprovam as recentes apreensões de granadas, fuzis e minas terrestres de uso exclusivo das Forças Armadas feitas pelas polícias estaduais do Rio de Janeiro.

As Forças Armadas têm legitimidade para agir contra os marginais que reúnem em seu poderio bélico armamentos contrabandeados ou extraídos dos seus paióis – dois crimes militares passíveis de ações decorrentes do IPM. Uma legitimidade para agir que, aliás, prescinde de acordos formais entre governos.

Como parte integrante da engrenagem de segurança pública nacional, as Forças Armadas não podem deixar que as demais peças continuem funcionando de forma sobrecarregada."

Marcelo Itagiba publicou o artigo acima no O Globo, em 28 de maio de 2004

(Matéria recebida por e-mail)

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