Não se sabe ao certo quando foi adquirida a primeira máquina de escrever para a Corporação. Narra a tradição que foi ali pela época da mudança da Capital de Minas. Recebendo um catálogo de propaganda, o Comandante teria chamado o Tenente-Secretário e o incumbido da presidência de uma comissão para dar parecer e examinar o aparelho. O Secretário, que era moço inteligente, andava frequentando a casa de um amigo que possuía uma máquina, nela aprendendo a "catilografar" nas horas vagas. Em companhia dos outros dois oficiais, foi à cidade, examinou a máquina e apresentou depois o parecer assinado pelos três.
Quando a máquina chegou ao quartel, o Comandante reuniu os oficiais para a apresentação do novo invento, explicando que ele poderia tirar, de uma só vez, dezenas de cópias do "Detalhe". Essa explicação provocou um grande murmúrio no gabinete do comando!
- Este mundo está perdido! Dizia um. Pois já se viu tal coisa?!
- É mesmo o fim do mundo! – Comentava outro. Isto eu já li na Bíblia.
Ficando só no gabinete, o Comandante desejou escrever pessoalmente uma carta ao Presidente do Estado. Acontece que ele não pedira certas explicações ao Tenente-Secretário, pois a disciplina não permitia que um superior recebesse lições de subordinado ...
Introduzindo o papel no rolo da máquina, deu inicie à carta que pretendia escrever, conseguindo, a muito custo, escrever "Cidade de Minas" tudo com letra minúscula. Quando foi escrever a data, notou que o teclado faltava o número 1!
Nervoso, pensando primeiro na ignorância de seus auxiliares, esquecendo-se da própria, mandou que o corneteiro de ordens desse o toque de "oficiais". Como não fosse hábito de os oficiais se reunirem àquela hora, todos ficaram logo eufóricos achando que fosse alguma perturbação da ordem. Por certo a República estava correndo perigo!
Arrastando as grandes rosetas de suas esporas - rrat, rrat, rrat - entraram no gabinete e se colocaram em fila por ordem hierárquica. O Coronel estava suando, nervoso, puxando sem parar as pontas do bigode. Todos em forma, começou ele com o "sabão":
- Então, senhores, eu designei uma comissão de oficiais para examinar a máquina de escrever, um aparelho tão caro, e me foram comprar uma faltando pedaços!!
Os oficiais se espantaram com aquele preâmbulo, pois a máquina nunca fora usada e era perfeita. Então falaram pela voz do Secretário:
- Mas, seu Comandante, a máquina não possui nenhum defeito ...
- Como não? Ela falta um algarismo - e apontou o teclado - o número 1... Deve ser defeito de fabricação ...
Os oficiais que não faziam parte da comissão, olhavam de oitiva os companheiros e pensavam:
- "E agora? Gomo vão os colegas sair desta?"
O Tenente-secretário percebeu logo o engano do Comandante, mas se acanhou de apontá-Io assim na presença dos demais. Mas, achando logo uma saída, foi explicando diplomaticamente:
- O objetivo dos técnicos é fazer economia. A gente escreve o 1 com esta letra aqui - e bateu no papel, formando um algarismo - de modo que a tecla serve para duas coisas a um só tempo ...
O Comandante sentou-se novamente e experimentou escrever a data. Deu certo. Não querendo, porém, se desmoralizar, virou-se para a ordenança que esperava do lado de fora:
- Mande dar o toque de debandar oficiais!
A corneta gemeu ali mesmo da janela e cada oficial foi saindo por sua vez... a comentar:
- Este mundo está perdido mesmo! Daqui a uns anos, a polícia será outra ... Prá gente entrar nela, vai sê o diabo... Tem que sê até maquinista ...
Fonte: Silveira, Geraldo Tito. Crônica da Polícia Militar de Minas. 1966. P. 417,418.